A indústria automóvel lucrou muito e, particularmente, os grandes grupos, durante 2021. Como é que isso foi possível num ano particularmente duro com problemas como os semicondutores? E com a esteira deixada pela pandemia de Covid 19? As vendas progrediram pouco ou nada e há lucros? E estes resultados com mercados a perderem vendas? Há uma explicação que nos deixa boquiabertos, pois quem paga esses lucros… somos todos nós consumidores de veículos automóveis!
A indústria automóvel é das mais resilientes. É das mais velozes a adaptar-se a crises, dificuldades ou inversões de política. Enfim, é um enorme contribuinte para os orçamentos nacionais. Mas não se pense que são os parentes pobres da economia. Longe disso!
Indústria automóvel lucrou acima do esperado
Olhando para os resultados já conhecidos dos grandes grupos industriais ligados à produção automóvel, ninguém diria que são cifras apuradas em 2021!
Enfrentando a esteira deixada pela pandemia de Covid-19 (que ainda não está no retrovisor!), o galopante preço das matérias-primas e a crise dos semicondutores, todos registaram lucros recordistas.
As contas não são minhas, mas do “Automotive News Europe”. Nesse sentido, o lucro operacional dos principais construtores europeus, coreanos e norte americanos mais que duplicou. Em 2020 tinha sido de 46,5 mil milhões de euros. Explodiu para 104,3 mil milhões de euros em 2021. O lucro líquido apurado em 2020 foi de 21,7 mil milhões de euros, ao passo que em 2021 cresceu… 315% para 90,2 mil milhões de euros!
E neste balanço não estão os japoneses que têm a particularidade de o ano fiscal terminar, apenas, no final de março. Porém, olhando às vendas e às previsões, estão a caminhar para lucros recorde no ano fiscal de 2021.
Este é o TOP 10 dos modelos mais vendidos na Europa em 2021
No Top 10 das vendas, o VW Golf fechou 2021 como o carro mais vendido na Europa, mas o Renault Clio e o Dacia Sandero aproximaram-se…. muito!
Todos ganharam!
Os dados de 10 dos maiores construtores – Ferrari, BMW, Ford, Hyundai-Kia, General Motors, Mercedes-Benz, Renault, Stellantis, Tesla e Volkswagen – são públicos e fomos consultá-los. Isto para perceber como é que as coisas funcionaram durante 2021. E socorrendo-me das contas feitas por vários analistas europeus, chegamos a resultados interessantes.
Os construtores europeus conheceram um aumento de 130% nos lucros que chegaram, para eles, aos 69,5 mil milhões de euros.
Do mesmo modo, o lucro líquido aumentou 285% para 54 mil milhões de euros. Mas aqui temos de dizer que os 9,8 mil milhões de euros de lucro extraordinário apurado pela Mercedes-Benz Group (ex-Daimler) com o “spin off” da Daimler Trucks teve enorme influência.
Aliás, a Mercedes-Benz referiu que as receitas aumentaram 30% em 2021 graças às vendas de modelos de topo das submarcas Maybach e AMG.
Ou seja, o aumento de receitas e de lucros vai ter impacto nos acionistas, pois os construtores europeus vão distribuir um total de 16,5 mil milhões de euros em dividendos. Quando em 2020 ou não foram pagos dividendos ou estes foram muito pequenos.
Indústria automóvel lucrou muito na Europa
Olhando às contas dos grupos europeus, o grupo VW foi o mais rentável com 19,3 mil milhões de euros de lucro operacional. Em seguida está o grupo Stellantis com 18 mil milhões de euros. Finalmente, a Mercedes-Benz com 16 mil milhões de euros.
Fazendo contas à percentagem da margem de lucro operacional, a média europeia estabeleceu-se em, praticamente, 10%. Em 2020 não ia além dos 4,8%.
Stellantis com margem de lucro de 11,8% distribui 1,9 mil milhões de euros!
Aqui estão os resultados. Receitas líquidas de 152 mil milhões de euros. E a Stellantis com margem de lucro operacional de 11,8%!
General Motors domina no continente americano
Debruçando-nos sobre o outro lado do oceano, os americanos lucraram quase 31 mil milhões de dólares de receitas, um aumento de 113%. Já os coreanos da Hyundai Kia registaram um crescimento de 114% para receitas de 109,5 mil milhões de dólares.
A General Motors continua a ser a mais rentável com 14,3 mil milhões de dólares de lucro, um aumento de 47%. A Ford chegou aos 10 mil milhões de dólares, um aumento de 260%! A Tesla lucrou 6,5 mil milhões de dólares, mais 2 mil milhões que em 2020.
Simultaneamente, os construtores norte americanos registaram uma média de margem de lucro operacional de 9,7%. Um generoso crescimento face a 2020, que registou 5,2%.
Indústria automóvel lucrou e a Toyota é a mais rentável
Como referimos acima, os japoneses só no final de março terão as contas finais. Porém, em nove meses já apurados, a Toyota é o grupo mais rentável do mundo. O construtor número 1 lucrou 19,5 mil milhões de euros. Mais que o grupo VW em todo o ano de 2021!
Afinal, quem foi o líder mundial de vendas em 2021?
A crise dos semicondutores mergulhou o mercado mundial numa crise que, pelo visto, não tocou a todos. Uma crise que não teve impacto no líder mundial de vendas.
A Nissan e a Honda anunciaram crescimento de 86% nas receitas para 28,4 mil milhões de euros. Os construtores japoneses registaram uma média de margem de lucro operacional de 8,5%.
Vendas com recordes de receitas na indústria
Contas feitas, os europeus conheceram um aumento de receitas de 12%. Os americanos chegaram aos 13% e na Coreia do Sul ficou nos 15%. Agora, como é que isso foi possível?!
A justificação é simples: o marketing de todos os grupos funcionou e convenceram os consumidores a pagar mais pelos veículos. Sim, os veículos estão mais caros, os descontos são cada vez menos – porque feitos a partir de uma base de desconto bem mais elevada – e os tempos de espera maiores.
Ou seja, há menos produção e por isso os construtores privilegiaram os modelos mais rentáveis (leia-se, mais caros). Como os clientes não gostam de esperar meses ou até um ano pela chegada do seu carro, preferem pagar mais e terem o carro mais cedo.
Há construtores que subiram os preços até 20% dos modelos mais rentáveis. Fica, assim, explicado o aumento dos lucros.
Estes foram os automóveis elétricos ? mais vendidos no mercado nacional
Num ano em que a mobilidade elétrica conheceu um grande avanço, chegaram ao mercado novas propostas. Estes foram os mais vendidos em Portugal.
A outra razão está nos rigorosos programas de corte de custos que escovaram milhares de milhões de euros de desperdício, reorganizaram a produção e acabou com gorduras desnecessárias. Um exemplo? O melhor de todos. Carlos Tavares juntou a PSA e a Fiat Chrysler Automobiles (FCA) e “emagreceu” ambas já em quase quatro mil milhões de euros. De tal forma que já pensa em novo emagrecimento e anunciou, recentemente, que o ponto de equilíbrio de contas já está abaixo do patamar dos 50% das vendas.
Luca de Meo é outro bom exemplo. Apesar de todas as crises e de ventos contrários, a Renault cortou milhares de milhões de custos operacionais. E dois anos antes do previsto, o ponto de equilíbrio das contas baixou 40%.