A Silly Season da F1 parecia lareira com fogo murcho depois de quase todos terem encontrado o testo para a sua panela. Que é como quem diz, todos encontraram o lugar que, mais ou menos, desejavam. Foram-se embora alguns veteranos – ficou o mais veterano de todos, Fernando Alonso, mas pensa-se que é um robot… – entrou sangue mais ou menos novo e tudo ficou decidido. Pensavam assim os que seguem a F1 mais de perto. Estávamos, todos, enganados!
Sabia-se, desde que Mattia Binotto apresentou a demissão de “Team Principal” (TP) da Ferrari, que estava a chegar um preia mar de novidades. Porém, as proporções desta maré encorparam e quase parecia um tsunami, pois quatro das dez equipas que fazem parte do “Clube do Cebolinha” onde novas equipas não entram, mudaram de TP ou de CEO.
Mattia Binotto, suíço do lado italiano, estava há 23 anos da Ferrari – começou a subir a escada como engenheiro, brilhante, sendo comparsa dos títulos de Michael Schumacher – e decidiu sair ainda antes do final do ano. O futuro de Binotto é desconhecido, rumores empurram-no para a Red Bull, rumores atiram-no para a Sauber. Em breve saberemos.
Silly Season da F1: Frederic Vasseur manda na Scuderia Ferrari
Depois seguiu-se a novela “quem vai ocupar o lugar de Binotto?” que deixou todos em suspense até que Frederic Vasseur deu o flanco. Primeiro demitiu-se da Sauber (a base da equipa Alfa Romeo). E depois de um desmentido formal da Ferrari – mais uma patetice dos italianos – eis que o francês é anunciado como TP da Ferrari.
Notam alguma analogia com o passado? Vasseur é francês… Jean Todt também é francês e foi o TP da Ferrari durante os anos de Schumacher.
Frederic Vasseur teve uma equipa própria (ASM), mas em 2004 juntou-se à equipa ART Grand Prix de… Nicolas Todt e venceu a GP2 em 1992 com Nico Rosberg e em 1993 com Lewis Hamilton.
Foi ele que esteve na génese da Fórmula E. Isto porque era dele a Spark Racing Technology que arrebatou o contrato para fazer os 40 chassis da primeira série da Fórmula E, no final de 2013.
Foi o TP da Renault Sport F1 Team em 2016. Desentendeu-se com Cyril Abitboul na forma como a equipa deveria ser conduzida e chegou à Sauber em 2017. Aqui com o cargo de CEO da empresa e TP da equipa de Fórmula 1. Veremos o que vai fazer este francês na equipa italiana.
Silly Season da F1: Andreas Seidl assume controlo da Audi F1, perdão, da Sauber
Rei morto… rei posto! Minutos depois da Ferrari anunciar que Frederic Vasseur seria o seu novo Team Principal, a Sauber anunciou que Andreas Seidl seria o novo CEO e TP da Audi F1, perdão, da Sauber F1. Ou Alfa Romeo F1 Team Orlen se preferirem.
Segundo o bonacheirão do Zak Brown, patrão da McLaren F1, o alemão vindo da Porsche já o tinha avisado que não iria renovar o contrato. Brown disse que sabia disso entre a primeira e a última prova do campeonato. Mas, senhor Zak, claro que soube de tudo assim que a Audi acertou os chakras todos para entrar na Fórmula 1 em 2026.
Obviamente que Seidl aceitaria qualquer que fosse a proposta da Audi para regressar a seio alemão e voltar a falar a língua de Goethe. Mesmo que o seu contrato com a McLaren só terminasse em 2025. E seria cumprido, se Binotto não tivesse feito mexer os alcatruzes da nora espoletando estas mexidas.
Há só um detalhe… Andreas Seidl vai ser o CEO da Sauber. Não é diretor desportivo ou TP da Alfa Romeo F1 Team, pois para esse lugar estão a tentar contratar alguém.
Andrea Stella ocupa o lugar de Seidl
Zak Brown já sabia há muito tempo deste “Mary Go Around” na dança de cadeiras, e foi rápido a anunciar o substituto de Seidl. É verdade que este anúncio só seria feito em 2025 para entrar em vigor em 2026.
O americano quis ser amigo. Foi contactado por Finn Rausing, o discreto dono da Sauber (cada vez mais a aparecer nos holofotes). A ideia era libertar Andreas Seidl mais cedo. O americano cedeu.
Depois, Zak Brown virou-se na cadeira e resolveu o assunto internamente. Apesar de ainda estarem à espera do túnel de vento e do simulador mais perfeito, a McLaren tem muita resiliência. E é assim que Andrea Stella se tornou o sucessor de Andreas Seidl. O italiano ainda hesitou, pois detesta exposição mediática, gosta mais de estar nos bastidores. Agora terá de dar passo em frente! Mas já veio dizer que estejam todos tranquilos que ele está pronto depois de ter aprendido durante tantos anos.
Recordamos que Andrea Stella está na McLaren desde 2015. Foi chefe de operações, depois diretor de performance (2018) e desde dezembro de 2019 está como Diretor Executivo.
Mas a carreira de Stella começou muito antes. Trabalhou para a Ferrari durante 15 anos, com Michael Schumacher, Kimi Raikkonen, Fernando Alonso e… Mattia Binotto. Esteve com o “Napoleão” Jean Todt e teve como patrões Stefano Domenicali e… Andreas Seidl!
Stella irá controlar a equipa na fábrica e na pista, elevando uma relação profissional que já existia com o diretor técnico James Key.
Silly Season na F1: Williams despeja Jost Capito e FX Demaison
Depois de dois anos à frente da Williams da Dorilton Capital, Jost Capito – o homem que deu à Volkswagen a hegemonia no Mundial de Ralis – foi dispensado pela empresa de Mathew Savage. Recordamos que, Capito, foi o CEO da McLaren F1 antes da chegada de Zak Brown. Mas o conflito de ideias entre o americano e Ron Dennis levou à saída deste e Jost Capito ficou sem apoio. Uma remodelação atirou-o borda fora.
Exatamente o mesmo que sucedeu agora, mas na Williams. Sendo que, desta feita, juntamente com ele, veio FX Demaison (FX=François Xavier), apontado como um erro de casting por parte da Williams.
O francês foi um dos engenheiros da Peugeot Sport desempenhando o papel de responsável pelos ralis. Antes de se mudar para a Prodrive e para a Subaru no Mundial de Ralis em 2006. Depois esteve como responsável técnico da Petter Solberg World Rally Team em 2010. Chegou à Volkswagen Motorsport em 2011 pela mão de Jost Capito, como gestor de projeto. Rapidamente subiu a Diretor Técnico com a responsabilidade de gerir em termos técnicos todas as atividades da Volkswagen Motorsport.
O projeto do Polo R WRC é dele, um carro dominador que foi quatro vezes campeão do Mundo de Ralis (2013 a 2016). Foi também FX Demaison quem ajudou a criar o VW ID.R que bateu vários recordes.
Em 2021 chegou à Williams, uma vez mais, pela mão de Jost Capito, sendo o responsável pela engenharia, desenvolvimento e atividade em pista. Sai da Williams com Capito no final deste ano, desconhecendo-se o futuro de ambos. Mas o Mundial de Ralis clama por eles…
Mas, afinal, quais foram as razões para estas mudanças?
Desde logo o teto orçamental da Fórmula 1. Neste momento, já não é possível esconder os erros com despejo de dinheiro. Hoje, as equipas têm de ser precisas, eficientes, disciplinadas e tudo tem de ser feito bem à primeira.
Hoje, com o infame teto orçamental, as assimetrias são maiores, mas, por outro lado, já não podemos disfarçar os nossos insucessos apontando o dedo ao livro de cheques dos outros. Os erros são, agora, muito mais evidentes.
Hoje, os responsáveis das equipas – ou principais da equipa ou Team Principal – têm maior responsabilidade e têm o traseiro muito mais perto da chama do insucesso que teima em queimar tudo e todos.
Mattia Binotto saiu da Ferrari pelo próprio pé porque John Elkann, o presidente da Ferrari e da Exor, a dona da casa de Maranello, e Benedetto Vigna, o CEO da marca do Cavallino Rampante, deixaram de acreditar na bonomia do suíço, queimado em lume brando pelos muitos erros cometidos pela equipa.
Hoje, as equipas de Fórmula 1 precisam de gente nova que saiba ler um regulamento e que tenha a certeza 100% positiva que o custo de alguma coisa verte, integralmente, para fazer o carro andar mais depressa.
O desempenho já não vem, só, da mudança de uma asa dianteira ou de um qualquer dispositivo aerodinâmico, porque o dinheiro está contado e não se pode fazer alterações a cada fim de semana de corridas.
O avanço é garantido por outras áreas onde há menos gente e mais trabalho, o que implica motivar as tropas e fazê-las acreditar que o sucesso está ao virar da esquina e que só é preciso mais um esforço.
Enfim, a Fórmula 1 não se compadece com experiências do passado… tem tudo a ver com a escolha dos tempos certos – até para fazer melhorias no carro a tempo de elas surtirem efeito, pois não há margem de erro – e manter rédea curta nos gastos e nos desperdícios. Por isso é que, hoje, os responsáveis das equipas estão tão expostos e é também por isso que esta dança de cadeiras aconteceu.
Muita água vai passar por debaixo das pontes até ao início da temporada 2023, mas preparem-se que podem vir a trote mais algumas novidades e surpresas.