Os estilhaços da invasão da Ucrânia pela Rússia voam e espalham problemas pelo mundo. A indústria automóvel foi atingida em cheio pelos problemas operacionais provocados pelas ações bélicas, mas também pela tenaz de sanções económicas que o mundo aperta com cada vez mais vigor. Se a face da guerra está cada vez mais feia, as ondas de choque vieram amontoar-se aos problemas deixados pela esteira da pandemia de Covid-19 e da crise dos semicondutores.
Ao oitavo dia de guerra entre Rússia e Ucrânia sabemos que Volkswagen, BMW e Toyota, entre outras, pararam a produção das suas fábricas na Rússia. Pararam o envio de veículos e material para o país, juntando-se, assim, à tenaz das sanções económicas.
Antes destes construtores pararem a produção, já as cadeias de abastecimento com sede na Ucrânia tinham sido cortadas e provocado perturbação nas unidades de produção europeias.
Indústria automóvel com paragens de produção
No grupo Volkswagen, a Audi vai suspender a produção do A4 e do A5 em Ingolstadt entre 7 e 11 deste mês. Já em Neckarsulm, a casa alemã vai parar a produção do A6 e do A7 entre 7 e 18 de março.
No mesmo sentido, Volkswagen, Porsche e Bentley pararam a exportação de veículos e a produção local. Significa isso a paragem de duas unidades de produção na Rússia que fabricam modelos para a VW e Skoda. O mercado russo é apetecível para a Porsche, Lamborghini e Bentley, pois são marcas desejadas pelas elites russas.
Paralelamente, a Porsche foi forçada a parar a produção em Leipzig (onde são feitos o Macan e o Panamera) devido a cortes na cadeia de abastecimento.
A Nissan parou a exportação de veículos para a Rússia devido a constrangimentos de logística. Uma perda sensível, pois, a Nissan vendeu 53 mil veículos na Rússia.
No mesmo sentido, a Mercedes-Benz anunciou que deverá conhecer redução de produção devido à falta de componentes produzidos na Ucrânia. Haverá uma gestão de produção, diversificação de fornecimento e, assim, evitar a paragem da produção.
Perturbação na logistica e nas transações
Por outro lado, as convulsões económicas e bélicas estão a prejudicar as redes de logística e as transações financeiras da indústria automóvel.
A Toyota já parou, também, a produção na Rússia e a exportação de veículos para aquela geografia. A casa japonesa produz 80 mil unidades em São Petersburgo e é a marca japonesa mais vendida. Já a Honda parou a exportação de motos e carros para a Rússia, alegando que não quer fazer negócio com o invasor ucraniano.
Na resposta à agressão da Rússia à Ucrânia, a Ford decidiu suspender todas as operações na Rússia, inclusive a “joint venture” com a Sollers.
Também a Jaguar Land Rover e Aston Martin pararam a exportação para a Rússia devido, não só as dificuldades logísticas como com os constrangimentos derivados das sanções. Contudo, há mais construtores a suspenderem a exportação de veículos para aquele país, é o caso da Volvo.
Do lado da Stellantis não foi tomada nenhuma decisão, tendo sido formados dois grupos de trabalho para monitorizar a situação. Um olha para as sanções impostas à Rússia, o outro tem atribuída a vigilância sobre os 71 funcionários da Stellantis na Ucrânia.
Stellantis com margem de lucro de 11,8% distribui 1,9 mil milhões de euros!
Aqui estão os resultados. Receitas líquidas de 152 mil milhões de euros. E a Stellantis com margem de lucro operacional de 11,8%!
Renault em apuros com a ligação à Rostec
Porém, há um construtor dentro da indústria automóvel que acaba de ficar debaixo dos holofotes: a Renault! Desde logo o facto do grupo francês ter perdido 1/4 do seu valor com os preços por ação a caírem para mínimos não vistos desde novembro de 2020.
Contas feitas, a queda foi de 11%, deixando o seu valor bolsista em 7,5 mil milhões de euros. Tudo porque a Renault está muito exposta à Rússia. Aquele país é o seu segundo maior mercado gerando cerca de 5 mil milhões de euros de rendimento, cerca de 12% do total.
Mas o grande problema está no facto de ter feito um acordo, em 2007, com um dos maiores aliados de Vladimir Putin no valor próximo dos mil milhões de euros. A compra do controlo acionista da AutoVAZ (a empresa que faz os Lada) deixa a Renault totalmente exposta face ao problema originado pela invasão da Ucrânia por parte da Rússia.
Esta parceria vale, como disse acima, 12% do seu rendimento anual e começa a preocupar os acionistas da casa francesa. Cortar, já, com a parceria poderá ser um golpe de morte para a Renault. O construtor está, ainda, fragilizado por dois anos de fortes prejuízos e o futuro debaixo deste conflito bélico não é brilhante.
Posição delicada
Juntamente com tudo isso, a operação na Rússia liberta 315 milhões de euros de lucro operacional. Ou seja, é evidente que a situação da Renault não é brilhante.
Curiosamente, o Governo francês é dos mais empenhados na resolução do conflito, mas tem estado calado sobre esta ligação da Renault (da qual o Estado Francês é o mais forte acionista) à AutoVaz e à Rostec State. Esta é a empresa estatal russa ligada á defesa e liderada por Sergey Chemezov, grande aliado de Putin.
Numa declaração à imprensa, Gabriel Attal, porta-voz do Governo francês, referiu que “a Renault prometeu cumprir com as sanções”. Da AutoVaz nem uma palavra e da Renault apenas a promessa de monitorização da situação.